Silêncio Negro
14.02-23.03.2019

Silêncio Negro

Luiz Martins 14.02-23.03.2019

“Intuindo o meu caminho entre o popular e o erudito, a fonte e o refinamento e depois de haver feito algumas composições, passei a ver nos instrumentos simbólicos um tipo de ‘fala’, uma poética visual brasileira capaz de configurar e sintetizar adequadamente todo o núcleo de meu interesse como artista.”

Rubem Valentim

As palavras do mestre Rubem Valentim (1922-1991) ecoam na trajetória de Luiz Martins. Para a sua segunda exposição individual na galeria, o artista apresenta uma série de trabalhos na qual se debruça sobre um tema caro à sua pesquisa: suas origens e a construção de sua linguagem. Autodidata, nasceu na pequena cidade de Machacalis, interior de Minas Gerais, em uma família de descendência afro-brasileira, de um lado, e pertencente à tribo indígena dos maxakali, de outro. As pinturas rupestres daquela região povoam seu imaginário desde seu primeiro contato com a arte, estética ancestral que atua como elemento estrutural em sua produção.

Sua história pessoal segue como a de tantos brasileiros: aos 17 anos, muda-se para São Paulo, onde vai experimentar a dura vida da periferia, os percalços e os inúmeros mecanismos de exclusão das populações marginalizadas, esse lugar de escuridão e esquecimento em que tantos acessos são negados. As marcas desta trajetória aparecem no silêncio das formas de Luiz Martins: substituições simbólicas de um persistente processo de silenciamento, resgate de uma história ainda tão presente em situações de seu cotidiano.

Seu trabalho, antes gráfico que geométrico, apresenta estas formas por vezes pairando sobre a escrita, expressão da cultura em seus diversos cânones: folhas de dicionário, bíblia ou tabloides, representantes do discurso dominante do branco europeu, palavras que por tantas vezes se transformaram em instrumentos de violência literal e simbólica. Os materiais, as texturas, as “peles” e seres que habitam o universo do artista carregam este simbolismo.

Em um período em que importantes instituições ao redor do globo promovem exposições a fim de reparar a histórica exclusão das minorias do circuito de arte, podemos situar seu trabalho a partir da discussão apresentada na exposição “Soul of a Nation: Art in the Age of Black Power” – que passou pela Tate Modern, em Londres, e o Brooklyn Museum, em Nova York. Na mostra é colocado em xeque o lugar da arte política apenas enquanto arte figurativa, apontando o lugar da abstração como de igual importância neste debate – e é sobre este lugar de fala que se dedica a presente exposição de Luiz Martins.

Em sua mais recente série, ao sobrepor suas formas sobre antigos desenhos de Debret e Rugendas, que categorizavam e atribuíam características e funções às diferentes raças, o artista faz referência a processos persistentes na estruturação da sociedade, e ainda uma sutil crítica a um mercado que até hoje premia e destaca estereótipos políticos e culturais. Antes de mais nada, é o lugar do corpo e a ancestralidade deste corpo – que neste caso nenhuma figuração poderia representar em seu todo – que interessa a Luiz Martins, contundente expressão de sua complexa e fascinante história de vida.

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