Luisa Malzoni

Luisa Malzoni

n.São Paulo, BR (1980)

Em seu trabalho, Luisa Malzoni costura diferentes dimensões da memória. Álbuns de família, objetos herdados, peças de roupa e tecidos antigos são resgatados do passado e ressignificados no presente por meio de processos artesanais, como as técnicas fotográficas do século 19.
Assim são as séries Tessituras, que compõe uma colcha de retalhos fotográficos e partir do vestido de noiva da avó da artista, e Organdie, em que fotos antigas são impressas com cianótipo em tecidos. Já em Memórias esquecidas, fotos e álbuns antigos sofrem intervenções de técnicas manuais, como pintura em aquarela e revestimento em gaze.
Para a série Estereoscópicas, Luisa registrou diversas imagens em estereoscopia e desenvolveu, em madeira, o visor binocular. Este trabalho explicita ainda como a artista, restauradora de filmes na Cinemateca Brasileira desde 2005, dialoga, em sua produção autoral, também com as primeiras técnicas coloridas utilizadas no cinema: os detalhes coloridos de “Serpentine dance” lembram os fotogramas coloridos à mão que registravam a bailarina norte-americana Loie Fuller (1862-1928).
Formada em fotografia pelo Senac, Luisa foi influenciada pelo professor Kenji Ota, reconhecido fotógrafo paulistano, interessando-se por experimentações com processos como albúmen, goma bicromatada e marrom vandike, além do cianótipo. Desde 2021, desenvolve na USP pesquisa de mestrado sobre o restauro da cor do cinema silencioso no Brasil.
Representada pela Verve Galeria desde 2013, participou de inúmeras exposições no Brasil e no exterior, e possui obras no Museu de Arte do Rio – MAR. Ganhou o prêmio Jabuti 2020 na categoria capa, com o livro Penitentes – dos ritos de sangue à fascinação do fim do mundo, do fotógrafo Guy Veloso, junto com as artistas Beatriz Matuck e Isabel Santana Terron.

Texto: Luisa Destri

"Tecer lembranças para construir memórias", por Rosely Nakagawa, 2018

A memória não é um simples lembrar ou recordar, mas revela uma das formas fundamentais de nossa existência, que é a relação com o tempo e, no tempo, com aquilo que está invisível, ausente e distante, isto é, o passado. 

Marilena Chauí

 

Na filosofia, a memória é a garantia da estruturação da identidade, possibilitando o encontro consigo mesmo. 

O fio da lembrança tecido com rastro de luz que denuncia um gesto, a película tênue riscada no papel, a mancha seca; o rés do chão, o nó da lã, a dobra do lenço, a umidade do choro: a construção da memória através dessa trama urdida como experiência primordial é o que se pode depreender da experiência estética a que se dedica a artista Luisa Malzoni.

Experiência-ensaio desenvolvida desde quando escreveu o verso bordado que em sua obra se apresenta ao lado de fotografias, realizadas em suportes dos quais se apropria neste percurso – tesouros percebidos em recantos e recolhidos pela curiosidade de menina que não deixou de ser. O calor da areia, o cheiro de sol, o áspero da folha, o barulho do vestido e o que mais lhe interessar, evocados para não esquecer, mas especialmente guardados para restaurar o futuro.

A memória que não evoca o passado, mas testemunha a continuidade cheia de brilho e cuidado ao construir um tempo presente. Olho d’água brotando com a preservada mata que a rodeia, semeada ao longo do tempo, e combinando amor com bordado, carinho com tinta, devoção com luz e trabalho com muito prazer.